Direitos dos Pacientes com Suspeita e Diagnóstico de Câncer


 

Nem toda batalha contra o câncer começa com exames e diagnósticos. Às vezes, o primeiro obstáculo é conseguir que o sistema de saúde funcione como deveria. Mas e se te disséssemos que há leis que garantem o que parece impossível? Prazo para biópsia, início do tratamento, negativa do plano… Tudo tem regra. E tem gente lutando com coragem – e com seus direitos.

Ela descobriu o câncer sozinha, mas precisou da Justiça para começar o tratamento.

Joana* tem 39 anos, é professora e vive em São Paulo. Durante um banho de rotina, notou um pequeno nódulo no seio esquerdo. O primeiro instinto foi procurar seu ginecologista, que prontamente solicitou exames mais detalhados, incluindo uma biópsia. Mas veio a surpresa: o plano de saúde negou a cobertura, alegando que o procedimento solicitado “não estava previsto no rol da ANS”.

A recusa gerou desespero. O medo do diagnóstico se somava à frustração de enfrentar a burocracia. Joana decidiu não esperar. Com a ajuda de uma advogada especializada em saúde, ingressou com uma ação judicial. Poucos dias depois, a liminar foi concedida e a biópsia realizada. O resultado confirmou um câncer de mama em estágio inicial.

Esse caso, infelizmente, está longe de ser isolado. Muitos pacientes com planos de saúde se deparam com negativas infundadas, atrasando diagnósticos e colocando em risco a chance de cura. Mas o que nem todos sabem é que o próprio Judiciário tem reconhecido a abusividade dessas recusas, especialmente quando o pedido médico é fundamentado.

No caso de Joana, o tempo foi decisivo. O tratamento, iniciado logo após o diagnóstico, teve boa resposta e já está em fase final. A negativa poderia ter comprometido esse desfecho.


Direito à vida não pode esperar

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) determina prazos claros: exames devem ser autorizados em até 3 dias úteis – e, se forem urgentes, o prazo é de até 24 horas. A jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça reconhece que o rol de procedimentos da ANS é apenas exemplificativo, e não limitativo. Ou seja: se o médico prescreveu e há justificativa, o plano não pode negar.

Além disso, a Lei nº 12.732/12 — conhecida como a "Lei dos 60 Dias" — obriga que pacientes diagnosticados com câncer comecem o tratamento pelo SUS em até 60 dias. Mas, em muitos casos, essa espera também pode custar caro.

Era só uma lesão pequena, diziam. Mas ele sabia que não podia esperar.

Foi o que aconteceu com Marcelo*, de 45 anos, morador de Porto Alegre (RS). Ele procurou atendimento no SUS após notar uma pequena lesão escura e irregular nas costas. O diagnóstico veio rápido: carcinoma basocelular — um tipo de câncer de pele comum, mas que pode evoluir rapidamente se não tratado.

Mesmo com o laudo em mãos e indicação cirúrgica imediata, o procedimento foi adiado por diversas vezes. A justificativa? Era uma lesão pequena, “não urgente”. Mas Marcelo sabia que o tempo era inimigo. A lesão começou a crescer e apresentar sangramentos. Foi aí que decidiu procurar ajuda jurídica. Em menos de uma semana após ingressar com a ação, a Justiça determinou a realização da cirurgia — que, felizmente, foi um sucesso.

Casos como o dele mostram que, embora o SUS conte com diretrizes bem estruturadas, muitas vezes a execução falha - não por maldade, mas por sobrecarga e gestão. O câncer de pele, quando detectado cedo, tem altíssimas chances de cura. Mas se negligenciado, pode infiltrar-se nos tecidos, gerar metástases e comprometer órgãos vitais, podendo, inclusive, evoluir a óbito.

SUS ou plano: ambos têm prazos e regras

É essencial que os pacientes — seja na rede pública ou privada — conheçam seus direitos. No SUS, o tratamento deve ser iniciado em até 60 dias após o diagnóstico. Já os planos de saúde devem autorizar rapidamente exames e cirurgias com base em critérios médicos, não burocráticos.

E mais: o paciente tem direito a receber por escrito qualquer negativa. A recusa deve ser fundamentada — e pode ser contestada judicialmente ou até administrativamente, junto à ANS ou à ouvidoria do SUS.

Guarde tudo: cada papel pode ser decisivo

Documentos, laudos médicos, pedidos, e-mails, mensagens e protocolos devem ser arquivados. Esses registros formam a base para qualquer contestação legal e são essenciais caso o paciente precise buscar a Justiça.

🎗 Informação salva vidas

Câncer é uma corrida contra o tempo. Diagnóstico precoce e tratamento imediato aumentam exponencialmente as chances de cura e diminuem os efeitos colaterais. Quando o sistema falha, a informação se torna uma das armas mais poderosas do paciente.

Joana e Marcelo são provas disso. Ambos recorreram à Justiça para fazer valer o direito à vida. E venceram.

O que fazer diante de uma negativa ou demora?

  1. Solicite a justificativa da recusa por escrito;
  2. Guarde todos os documentos relacionados ao caso;
  3. Busque orientação jurídica especializada, especialmente de advogados que atuam com direito à saúde;
  4. Não aceite justificativas vagas como “fora do rol da ANS”;
  5. Aja rápido: tempo é essencial, e os tribunais costumam conceder liminares em casos urgentes.

Quando a burocracia atrasa, a Justiça pode acelerar.

Se você ou alguém próximo está enfrentando uma situação semelhante, saiba que não está sozinho. Há caminhos legais, há jurisprudência favorável — e há profissionais comprometidos com o seu direito à saúde.

*Os nomes usados nessa postagem são fictícios para preservar a identidade dos pacientes.

Dra. Cíntia Leite - Advogada